O sábio Diógenes, depois de ser expulso de sua
cidade natal Sínope, fez morada em um barril, em Atenas. Seus únicos bens eram
um alforje, um bastão e uma tigela. Todos os dias pegava uma lanterna e, em
plena luz do dia, saia caminhando pelas ruas procurando um homem honesto. A
única coisa que lhe interessava era desbancar os valores sociais do que ele via
como uma sociedade corrupta e, desenvolver as virtudes humanas. Isso acontecia,
ironicamente, em uma sociedade, que segundo alguns historiadores, inventou a
política.
Politica quer dizer “o exercício do Poder”.
Para exercer a autoridade deve-se agir com coerção sobre alguém. Há três
maneiras básicas para coagir: a forma tradicionalista, que é o mando que passa
de pai para filho, a da legalidade, através da competência de um estatuto
legal, fundado em regras e, através do carisma, que significa dizer: a devoção
depositada em alguém. A confiança que se deposita em outra pessoa. É a
admiração pela fé. O fato é que não existe política sem dominação, através da
coerção. Deste modo, todo homem que se entrega ao exercício político aspira
poder.
Para o Filósofo Samael Aun Weor, que de igual
maneira renunciou, também, ao mundo corrupto exterior, assim como Diógenes, o
importante não são as formas, mas, o conteúdo: “no mundo existem certas
maneiras religiosas que só conduzem a um beco sem saída, mas seus seguidores
insistem em se purificar trancados em tais prisões. Se deve renunciar a essas
doutrinas, se deve ter o valor de renunciar a tais jaulas. O importante é o que
está dentro de nós”. Samael afirma nas entrelinhas, nesta citação, que o mundo
dos conceitos, do intelectualismo politico, ou religioso, o mundo dos dogmas, e
das disputas, mesmo que seja dentro do Movimento Gnóstico, é uma prisão
intelectual que não leva a lugar nenhum.
No evangelho Gnóstico de Thomé encontramos: “se
vossos guias vos disserem: Olhai, o Reino está no céu, então os pássaros do céu
vos precederão. Se vos disserem: está no mar, então os peixes vos precederão.
Mas o reino está dentro de vós e está fora de vós. Quando vos chegueis conhecer
a vós próprios, então sereis conhecidos e sabereis que vós sois os filhos do
Pai vivente. Mas se vós não vos conhecerdes, então ficareis na pobreza e sereis a pobreza.”
Da mesma forma, quando Maria Madalena pergunta
a Jesus sobre qual é o pecado do mundo, ele responde: “não há pecado, no
entanto, vós cometeis pecado quando praticais as obras da natureza do adultério
denominada pecado”... “Por isso ficais doentes e morrereis, uma vez que
praticais o que vos extravia. A matéria gerou uma paixão carente da semelhança,
uma vez que procedeu um ato contranatural”.
A busca do despertar, então, exige certa
qualidade que foge dos padrões sociais antigos e modernos: a abnegação.
Abnegar-se é renunciar algo em benefício próprio. Na política o que mais se
quer é o exercício do poder em benefício próprio. Essa maneira de proceder
sufoca nossa verdadeira realidade, isso que está dentro de nós e que podemos
rotular de chispa divina.
Diz o Evangelho da Verdade: “uma vez que a
totalidade procurou aquele de quem tinha saído, e a totalidade estava dentro
dele, o incompreensível, impensável, que esta sobre todo o pensamento, ignorar
o pai provocou angustia e dor. Mas a angústia tornou-se densa como a bruma, de
maneira que ninguém podia ver; por este motivo se fortaleceu o erro; trabalhou
sua matéria em vão, uma vez que não conhecia a verdade”.
De acordo com o Evangelho da Verdade, dos
Evangelhos Apócrifos Gnósticos, ignorar essa essência divina que está dentro de
nós, a Pistis Sophia, que saiu do Pleroma, ou dos mundos superiores, é cultivar
a dor em nós. Buscar alimentar essa essência, que por natureza é altruísta,
rega-la com abnegação é o caminho, assim demostrou Diógenes, que com sua “doutrina
cínica” criticava o mundo das vaidades.
Mais do que dizer que Samael, ou o próprio
Apóstolo Thomé, teriam interpretações marxistas da religião, devemos entender
que eles não se colocavam contra Deus, mas diziam que ele não está fora, e sim
dentro de nós. Diziam ainda, que através da prática do autoconhecimento podemos
entrar no reino dele, que também está dentro de cada um de nós.
Exercitar o poder da coerção, então, é a
cegueira que nos priva do conhecimento real de quem somos nós? O sentir-se
dominador, querer tirar proveito em benefício próprio é esquecer-se do Pai que
vive em nós. Se quisermos disputar poder com outros, como poderemos então praticar
a abnegação?
Jesus, o divino rabi da galileia, como bom
gnóstico que era, afirmou: “é dando que se recebe. E, quanto mais se dá, mais
se recebe”. Esse é o procedimento puro de um verdadeiro praticante do gnosticismo.
A Gnose é o conhecimento claro dos mistérios
divinos; a gnose é um funcionalismo muito natural da consciência desperta, é
uma filosofia perene e universal. Por isso, ela exige que se lance mão de todo o tipo de prisão: a ignorância.
Por isso é que todos os grandes sábios que
buscavam um despertar interior, um despertar para o mundo espiritual,
praticavam a abnegação e a renuncia das vaidades do mundo. Por isso, Diógenes
não queria nada. Queria apenas que as pessoas saíssem de sua frente para deixar
a luz do Sol passar e esquentar seu lar: o barril.
Paulo de Siqueira
Curitiba - Brasil