Renomado
professor de física da Universidade de Oregon e pesquisador do Institute of
Noetic Sciences, o indiano Amit Goswami mostra a seguir por que a reencarnação
é um fenómeno que merece ser investigado pela ciência. Para sustentar a sua
tese, ele reúne dados que indicam a sobrevivência da nossa consciência depois da
morte e os explica à luz da física quântica.
No
fim do século XIX, os teosofistas, sob a liderança de Madame Helena Blavatsky,
redescobriram para o Ocidente algumas antigas verdades orientais. A verdade da
ontologia perene – de que a consciência é a base de todo o ser – era clara para
eles. Eles reconheciam também dois princípios cosmológicos. Um é o princípio da
repetição para o cosmo inteiro – a ideia de que o universo se expande a partir
de um big-bang, depois se retrai num big-crunch e em seguida se expande outra
vez, esticando e encolhendo de modo cíclico. O segundo princípio era a ideia de
reencarnação – a ideia de que existe uma outra vida antes desta e haverá outra
depois da morte; nós já estivemos aqui antes e vamos renascer muitas outras
vezes.
Para
a mentalidade moderna, a reencarnação parece um tanto absurda. Sob implacável
pressão da ciência materialista, nós identificamo-nos quase totalmente com o
corpo físico, de modo que a ideia de que uma parte de nós sobrevive à morte do
corpo físico é difícil de engolir. Ainda mais difícil é imaginar um
renascimento dessa parte num novo corpo físico. A imagem de uma alma deixando o
corpo que morre e entrando num feto prestes a nascer parece particularmente incómoda,
porque pressupõe uma alma existindo independentemente do corpo. E nós tentamos
com tanto afinco erradicar o dualismo da nossa visão do mundo!
Mas o nosso monismo (1) não precisa ser um monismo fundamentado na matéria. Se, em vez da matéria, a consciência for a base de todo o ser, a primeira dificuldade – aceitar que uma parte de nós sobrevive à morte – é consideravelmente mitigada, pois pelo menos a consciência sobrevive à morte do corpo físico.
Além
disso, quando aprendemos que a nova ciência precisa incluir os corpos vital e
mental e o intelecto para captar o sentido do que acontece no nível material da
realidade, e que o corpo físico é uma espécie de computador (quântico) no qual
as funções vitais e mentais estão programadas num software fácil de usar, até
mesmo a aceitação da ideia de algo como uma alma se torna fácil. Não, isso não
requer dualismo. Nenhum de nossos corpos – o físico, o vital, o mental ou o
intelecto – é uma substância sólida, ao estilo newtoniano clássico; eles são,
em vez disso, possibilidades quânticas na consciência. A consciência
simultaneamente provoca colapsos de possibilidades paralelas desses mundos para
compor sua própria experiência de cada momento.
Dos
quatro corpos, apenas o corpo físico é localizado, estrutural e também
materialmente; é por essa razão que é chamado de corpo grosseiro. Nossos corpos
vital e mental são inteiramente funcionais, criados por condicionamento. Nós
desenvolvemos propensões a determinadas confluências de funções vitais e
mentais no processo de formação das representações no físico. Esses padrões de
hábito constituem-se memória quântica – o condicionamento das probabilidades
quânticas associadas às funções matemáticas de onda quântica desses corpos. É
uma boa descrição científica de uma parte de nós que sobreviveria à morte: o
corpo subtil – o conglomerado dos corpos vital, mental e temático –, no qual a
memória das propensões passadas (que os hindus denominam carma) é transportada
pela matemática quântica modificada dos corpos vital e mental. Podemos chamar
esse conglomerado de mónada quantica. (Além dos corpos grosseiro e subtil,
existe um terceiro, o corpo causal, constituído do corpo de beatitude do modelo
panchakosha, o qual, é claro, sobrevive à morte, porque é a base do ser. Para que
outro lugar mais ele iria?)
Com
isso, a reencarnação é elevada à categoria de fenómeno merecedor de
investigação científica, pois a melhor prova científica da existência do corpo subtil,
com seus componentes vital e mental, seria um indício de sua sobrevivência e
reencarnação. (2)
A
mónada quântica sobrevivente, de acordo com o nosso modelo, conserva a memória
quântica dos padrões de hábito e das propensões das vidas passadas. E existem
amplos dados em apoio à ideia que as propensões sem dúvida sobrevivem e
reencarnam. No entanto, todas as narrativas que acumulamos durante a nossa
existência, toda a nossa história pessoal, morrem, de modo geral, com o corpo
físico, com o cérebro; essas histórias não são transportadas pelas mónadas quanticas.
Mesmo assim, existem dados que mostram que algumas pessoas, especialmente crianças,
são capazes de lembrar-se de histórias de vidas passadas, frequentemente com um
nível de detalhe surpreendente. Qual é a explicação para essa memória reencarnacional?
A não-localidade quantica através do tempo e do espaço esclareceria isso.
Acredito
que todas as reencarnações de uma dada mónada quantica são conectadas
não-localmente através do tempo e do espaço, correlacionadas em virtude de uma
intenção consciente. Pouco antes do momento da morte, quando entramos num
estado que os budistas tibetanos denominam bardo (transição), a nossa
identidade-ego cede consideravelmente; e, quando mergulhamos no eu quântico,
tomamos conhecimento de uma janela não-local de recordações – passadas,
presentes e futuras. Quando agonizamos, somos capazes de travar uma relação
não-local com a nossa próxima encarnação, ainda sendo gestada, de modo que
todas as histórias que recordamos se tornam parte das histórias dessa
encarnação, agregando-se a suas recordações de infância. Essas recordações
podem ser evocadas, mais tarde, sob hipnose. E, em alguns casos, as crianças
conseguem evocar espontaneamente essas histórias de suas vidas passadas.
Como
a mónada quantica sabe onde deve renascer? Se as diferentes encarnações físicas
são correlacionadas pela não-localidade quantica e pela intenção consciente,
seria a nossa intenção (no momento da morte, por exemplo) que transporta a
nossa mónada quantica de um corpo encarnado para outro.
Indícios de sobrevivência e reencarnação
Existem
três tipos de indícios em favor da teoria da sobrevivência e reencarnação do
corpo subtil:
-
Experiências relativas ao estado alterado de consciência no momento da morte
-
Dados sobre reencarnação
-
Dados sobre seres desencarnados
Uma
espécie de indício vem do limiar da morte, a experiência de morte. As experiências
de visões comunicadas psiquicamente a parentes e amigos por pessoas à beira da
morte vêm sendo registradas desde 1889, quando Henry Sidgwick e seus
colaboradores iniciaram cinco anos de compilação de um Censo das Alucinações,
sob os auspícios da British Society for Psychical Research. Sidgwick descobriu
que um número significativo das alucinações relatadas envolvia pessoas que
estavam morrendo a uma distância considerável do indivíduo que alucinava, e
ocorria num prazo de 12 horas da morte.
Mais
conhecidas, evidentemente, são as experiências de quase-morte (EQMs), nas quais
o indivíduo sobrevive e se recorda de sua experiência. Nas EQMs, nós
encontramos uma confirmação de algumas das crenças religiosas de diversas
culturas; quem teve a experiência frequentemente descreve uma passagem por um
túnel que leva a um outro mundo, guiada, muitas vezes, por uma conhecida figura
espiritual da tradição da pessoa ou por um parente morto.
Tanto
nas visões no leito de morte quanto nas experiências de quase-morte, o
indivíduo parece transcender a situação de morrer, que, afinal, é frequentemente
dolorosa e desconcertante. O indivíduo parece experimentar um domínio de
consciência “feliz”, diferente do domínio físico da experiência comum.
A
felicidade ou a paz comunicadas telepaticamente nas visões no leito de morte
sugerem que a experiência da morte é um profundo encontro com a consciência
não-local e com seus diversos arquétipos. Na comunicação telepática de uma
experiência alucinatória, a identificação com o corpo que está padecendo e
morrendo ainda é claramente muito forte. Mas a subsequente libertação dessa
identificação permite uma comunicação integral da felicidade da consciência do
eu quântico, que está além da identidade-ego.
Que
as experiências de quase-morte são encontros com a consciência não-local e seus
arquétipos é algo confirmado por dados diretos. Uma nova dimensão da pesquisa
sobre a EQM demonstra que uma EQM pode levar a uma profunda transformação no
modo de vida do sobrevivente da experiência. Muitos deles, por exemplo, deixam
de sentir o medo da morte que assombra a maior parte da humanidade.
Qual
é a explicação para a imagética específica descrita pelos que passaram pela
EQM? As imagens vistas – personagens espirituais, parentes próximos como os
pais ou os irmãos – são claramente arquetípicas. Podemos aprender alguma coisa
comparando as experiências dos indivíduos com sonhos, uma vez que o estado que
eles experimentam é semelhante ao estado onírico: sua identificação com o corpo
se reduz e o ego deixa de ficar monitorando e controlando.
Dados sobre reencarnação
Os
indícios em favor da memória reencarnacional são obtidos principalmente a
partir dos relatos de crianças que se lembram de suas vidas passadas com
detalhes passíveis de comprovação. O psiquiatra Ian Stevenson acumulou uma base
de dados de cerca de duas mil recordações reencarnacionais comprovadas. Em
alguns casos, ele chegou a levar as crianças aos lugares das vidas passadas de
que se lembravam para comprovar suas histórias. Mesmo sem jamais terem estado
nesses lugares, as crianças os reconheciam e conseguiam identificar as casas em
que tinham vivido. Às vezes reconheciam até mesmo membros de suas famílias
anteriores. Em um caso, a criança lembrou-se de onde havia algum dinheiro
escondido, e, de fato, encontrou-se dinheiro ali. Os detalhes sobre esses dados
podem ser encontrados nos livros e artigos de Stevenson. Um dos modos de se
comprovar nosso modelo atual – de que a memorização reencarnacional ocorre numa
idade muito precoce, por meio de uma comunicação não-local com o eu à beira da
morte da vida anterior – seria verificar se os adultos são capazes de se
lembrar de experiências de vidas passadas, quando submetidos à regressão à
infância.
Dados sobre entidades desencarnadas
Até
aqui, falamos sobre dados que envolvem experiências de pessoas na realidade
manifesta. Mas existem outros dados, muito controversos, a respeito da
sobrevivência depois da morte nos quais uma pessoa viva (normalmente um médium
ou canalizador em estado de transe) alega se comunicar com uma pessoa, e falar
por ela, que já morreu há algum tempo e aparentemente habita um domínio além do
tempo e do espaço. Isso sugere não apenas a sobrevivência da consciência depois
da morte como também a existência de uma mónada quantica sem corpo físico.
Como
um médium se comunica com uma mónada quantica desencarnada? A consciência não é
capaz de provocar o colapso de ondas de possibilidade numa mónada quantica
isolada, mas, se a mónada quantica desencarnada entrar em correlação com um ser
material vivo (o médium), o colapso pode ocorrer. Os canalizadores são as
pessoas que possuem um talento especial e disposição para atuar nessa
qualidade.
O
fenómeno da escrita automática também pode ser explicado em termos de
canalização. As ideias criativas e as verdades espirituais estão disponíveis
para todos, mas o acesso a elas requer uma mente preparada. Como o profeta
Maomé foi capaz de escrever o Corão, mesmo sendo praticamente analfabeto? O
arcanjo Gabriel – uma mónada quântica – emprestou a Maomé, por assim dizer, uma
mente. A experiência também transformou Maomé.
Anjos e devas
Em
todas as culturas existem concepções de seres correspondentes ao que, no
cristianismo, se denomina anjos. Os devas são os anjos do hinduísmo. Em geral,
os anjos, ou devas, pertencem ao reino transcendente e arquetípico do corpo
temático, o que Platão chamava de reino das ideias, e são desprovidos de forma.
São os contextos aos quais nós damos forma em nossos atos criativos. Mas, na
literatura, e mesmo nos tempos modernos, também existem anjos percebidos pelas
pessoas como auxiliadores (como Gabriel, que auxiliou Maomé). Na linguagem de
nosso modelo, esse tipo de anjo poderia ser uma mónada quantica desencarnada
cuja participação no ciclo de nascimento e renascimento já terminou.
Notas
(1)
De acordo com o Dicionário Houaiss da língua portuguesa, o monismo é uma
“concepção que remonta ao eleatismo grego, segundo a qual a realidade é
constituída por um princípio único, um fundamento elementar, sendo os múltiplos
seres redutíveis em última instância a essa unidade”.
(2)
Saliente-se que F. A. Wolf (1996) elaborou um modelo de sobrevivência depois da
morte dentro do próprio paradigma materialista. Em sua teoria, no entanto, há
várias hipóteses que talvez não sejam viáveis; seu modelo de sobrevivência, por
exemplo, é válido somente se o universo vier a terminar num big-crunch.
Artigo
extraído do capítulo “A
Ciência e o Espírito da Reencarnação” do livro "AJanela Visionária: um Guia para Iluminação por um Físico Quantico, de Amit Goswami.
JFM Lisboa - Portugal
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